A vitamina D, frequentemente chamada de “vitamina do sol”, desempenha papel crucial em múltiplas funções fisiológicas no organismo, desde a clássica regulação do metabolismo ósseo até processos imunológicos e modulação da expressão gênica. Apesar de sua importância fundamental, estudos epidemiológicos mostram que aproximadamente 40% da população mundial apresenta níveis insuficientes desta vitamina, constituindo um problema global de saúde pública. Diante deste cenário, surge uma questão frequente: devemos priorizar fontes alimentares ou suplementação? Neste post vou apresentar evidências científicas atualizadas para responder a esta pergunta.
Quantidade e biodisponibilidade de vitamina D nos alimentos
A vitamina D está naturalmente presente em um número limitado de alimentos. Abaixo seguem as principais fontes e seus respectivos teores médios:
Fontes naturais (vitamina D3 – colecalciferol):
- Salmão selvagem: 600-1000 UI/100g (porção típica de 180g = 1080-1800 UI)
- Salmão de criação: 100-250 UI/100g (porção típica de 180g = 180-450 UI)
- Sardinha em óleo: 300-500 UI/100g (porção típica de 100g = 300-500 UI)
- Atum em conserva: 150-200 UI/100g (porção típica de 100g = 150-200 UI)
- Óleo de fígado de bacalhau: 400-1000 UI/colher de sopa (≈15ml)
- Gema de ovo: 20-50 UI/unidade (ovos de galinhas criadas ao ar livre podem conter até 3-4 vezes mais)
- Carne vermelha: 5-30 UI/100g
- Fígado bovino: 40-50 UI/100g
Fontes de vitamina D2 (ergocalciferol):
- Cogumelos shiitake frescos: 100 UI/100g
- Cogumelos shiitake secos: 1600 UI/100g
- Cogumelos expostos à luz UV: até 450 UI/100g
Alimentos fortificados com vitamina D (variam conforme legislação de cada país):
- Leite fortificado: 100-130 UI/copo (240ml)
- Bebidas vegetais fortificadas (soja, amêndoa): 100-140 UI/copo (240ml)
- Iogurtes fortificados: 80-120 UI/unidade
- Cereais matinais fortificados: 40-100 UI/porção
- Margarinas fortificadas: 50-60 UI/colher de sopa
Ingestão diária recomendada de vitamina D
É importante observar que a Ingestão Diária Recomendada (IDR) de vitamina D varia conforme idade e condições específicas:
- Bebês (0-12 meses): 400 UI/dia
- Crianças e adultos até 70 anos: 600 UI/dia
- Adultos acima de 70 anos: 800 UI/dia
- Gestantes e lactantes: 600 UI/dia
Considerando estas recomendações, fica evidente que, com exceção do consumo frequente de peixes gordurosos ou óleos de fígado de peixe, é extremamente difícil atingir as necessidades diárias apenas através da alimentação. Por exemplo, seria necessário consumir aproximadamente 5-6 copos de leite fortificado diariamente para atingir a recomendação mínima para adultos.
Além disso, existem diferenças significativas na biodisponibilidade das vitaminas D2 e D3. Estudos comparativos demonstram que a vitamina D3 é aproximadamente 87% mais eficaz na elevação e manutenção dos níveis séricos de 25-hidroxivitamina D quando comparada à vitamina D2. Portanto, fontes animais (ricas em D3) geralmente proporcionam melhor biodisponibilidade que fontes vegetais (D2).
Quando, como e quais precauções tomar ao suplementar vitamina D
Indicações para suplementação
A suplementação de vitamina D é particularmente recomendada para:
- Indivíduos com níveis séricos confirmadamente baixos de 25(OH)D (<20 ng/mL)
- Pessoas com exposição solar limitada (idosos institucionalizados, trabalhadores noturnos)
- Residentes de regiões com baixa incidência de raios UVB, especialmente durante o inverno
- Pessoas com pele muito pigmentada (fototipos V-VI) vivendo em latitudes elevadas
- Indivíduos com síndromes de má absorção intestinal ou doença hepática crônica
- Pessoas com obesidade severa (IMC >35)
- Usuários crônicos de medicamentos que interferem no metabolismo da vitamina D (anticonvulsivantes, glicocorticoides)
Como suplementar corretamente a vitamina D
O mercado oferece diversas formas de suplementação de vitamina D:
- Vitamina D3 (colecalciferol): forma preferencial para suplementação devido à sua maior biodisponibilidade e eficácia na elevação dos níveis séricos de 25(OH)D
- Vitamina D2 (ergocalciferol): menos eficaz que a D3, mas pode ser uma opção para vegetarianos estritos, já que é derivada de fontes não-animais
Disponíveis em apresentações variadas:
- Gotas (geralmente em base oleosa)
- Cápsulas ou comprimidos
- Cápsulas softgel (em base oleosa)
- Sprays orais
Para otimizar a absorção, considere estas recomendações:
- Administre junto a refeições contendo gorduras: por ser uma vitamina lipossolúvel, a vitamina D é melhor absorvida quando consumida com alimentos contendo gorduras saudáveis. Estudos demonstram aumento de até 50% na absorção quando administrada com refeições ricas em lipídios comparado à administração em jejum.
- Horário de administração: embora não exista horário ideal definitivo, alguns estudos sugerem melhor absorção quando administrada na principal refeição do dia, tipicamente o almoço ou jantar, pois costuma ter maior quantidade de gordura.
- Regularidade: mantenha um esquema regular de suplementação, preferencialmente no mesmo horário todos os dias.
- Monitoramento periódico: realize exames de 25(OH)D a cada 3-6 meses inicialmente, ajustando a dose conforme necessário para manter níveis séricos entre 30-50 ng/mL (75-125 nmol/L).
Suplementos de vitamina D de qualidade
Ao adquirir um suplemento de vitamina D, observe criteriosamente:
- Forma química: prefira colecalciferol (D3) ao ergocalciferol (D2), exceto se vegetariano estrito
- Pureza e transparência: verifique se o fabricante disponibiliza laudos de análise e testes de pureza
- Ingredientes adicionais: evite aditivos desnecessários, corantes artificiais e alergênicos potenciais
- Certificações de qualidade: busque selos GMP (Good Manufacturing Practices), USP (United States Pharmacopeia) ou outras certificações de órgãos reguladores
- Meio de veiculação: para maior biodisponibilidade, prefira fórmulas em base oleosa (gota, softgel) em vez de comprimidos secos
- Estabilidade e armazenamento: verifique as condições de armazenamento recomendadas e data de validade
Importante ressaltar que suplementos não passam pelo mesmo rigoroso processo de aprovação que medicamentos, o que exige maior diligência do consumidor na seleção de produtos de qualidade.
Vitamina D: alimentos ou suplementos? Uma análise comparativa
Considerando as evidências disponíveis, podemos estabelecer as seguintes comparações:
Vantagens das fontes alimentares de vitamina D:
- Fornecem outros nutrientes importantes além da vitamina D
- Apresentam menor risco de superdosagem
- Promovem hábitos alimentares saudáveis de forma integral
- Outros nutrientes naturalmente presentes nos alimentos atuam de forma sinérgica na matriz alimentar aumentando biodisponibilidade da vitamina D
Limitações das fontes alimentares de vitamina D:
- Conteúdo geralmente insuficiente para atingir as recomendações diárias
- Grande variabilidade no teor de vitamina D mesmo dentro do mesmo tipo de alimento
- Acesso limitado a alimentos naturalmente ricos (peixes gordurosos) em muitas regiões
- Dificuldade prática de consumo diário suficiente
Prós da suplementação de vitamina D:
- Dosagem precisa e ajustável
- Possibilidade de corrigir deficiências rapidamente
- Conveniência e praticidade
- Maior previsibilidade na elevação dos níveis séricos
Contras da suplementação de vitamina D:
- Risco potencial de superdosagem com uso prolongado e não monitorado
- Variabilidade na qualidade e biodisponibilidade dos produtos
- Ausência dos benefícios sinérgicos de nutrientes presentes nos alimentos
- Potencial para negligenciar alimentação saudável ao confiar apenas em suplementos
Conclusão
A questão “alimentos ou suplementos?” representa uma falsa dicotomia quando se trata de vitamina D. Na realidade, a maioria das pessoas se beneficia de uma abordagem combinada que inclui alimentação consciente, exposição solar adequada e suplementação personalizada quando necessário.
Para populações de risco, a suplementação representa uma intervenção crucial na prevenção das consequências da deficiência de vitamina D. Para a população geral, uma estratégia integrada que combine múltiplas fontes oferece a abordagem mais equilibrada e sustentável.
O mais importante é reconhecer que as necessidades são individuais e podem variar significativamente conforme idade, localização geográfica, estilo de vida, condições de saúde específicas e fatores genéticos. Portanto, o monitoramento periódico dos níveis séricos de 25(OH)D e a consulta com profissionais de saúde qualificados são fundamentais para uma estratégia personalizada e eficaz.
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Referências
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