Nutricionista Adriana Lauffer

SII, SIBO, DF ou SIFO?

SII, SIBO, DF ou SIFO

Se você sofre com distensão abdominal, gases, náuseas ou mudanças no trânsito intestinal, é comum ouvir o diagnóstico de síndrome do intestino irritável (SII). No entanto, condições como SIBO, SIFO e dispepsia funcional (DF) podem estar envolvidas — e até se sobrepor entre si. Por isso, entender as diferenças e conexões entre esses distúrbios é essencial para um tratamento eficaz.

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Síndrome do intestino irritável (SII)

A SII é um distúrbio funcional, ou seja, não envolve inflamação ou dano estrutural ao intestino. Ela se caracteriza por dor abdominal recorrente, associada a alterações no hábito intestinal (diarreia, constipação ou ambos). Embora não cause lesões visíveis nos exames, a SII afeta significativamente a qualidade de vida.

No entanto, o diagnóstico da SII é exclusivamente clínico, baseado nos critérios de Roma IV. Isso significa que, muitas vezes, exames complementares não mostram alterações, o que pode gerar frustração e atrasos no tratamento adequado.

Supercrescimento bacteriano no intestino delgado (SIBO)

Enquanto a SII é funcional, o SIBO é uma condição orgânica. Nesse caso, ocorre uma colonização excessiva de bactérias no intestino delgado, onde normalmente há poucas. Isso pode interferir na digestão, causar má absorção e levar a sintomas como gases, distensão abdominal, diarreia e até deficiências nutricionais.

A prevalência de SIBO varia amplamente, de 4% a 78% em pacientes com SII e de 1% a 40% em pessoas saudáveis (nem todas apresentam sintomas). Essa variação provavelmente ocorre devido a diferenças nas populações estudadas, devido aos critérios de diagnóstico para SII e aos métodos de diagnóstico para SIBO, que ainda são bastante discutidos.

Sobreposição de SII e SIBO

Estudos recentes mostram que muitos pacientes diagnosticados com SII, especialmente os com predominância de diarreia, na verdade têm SIBO como causa subjacente. Assim, o SIBO pode imitar a SII, e tratar o supercrescimento bacteriano pode levar à resolução completa dos sintomas.

Dispepsia funcional (DF)

A Dispepsia Funcional (DF) é outra condição funcional que afeta o trato digestivo superior. Os sintomas incluem plenitude pós-prandial, saciedade precoce, dor ou queimação na parte superior do abdômen. Muitas vezes, esses sintomas se sobrepõem aos da SII, especialmente quando o desconforto se localiza na parte superior do abdome.

Embora a causa exata da DF seja incerta, acredita-se que fatores como hipersensibilidade visceral, motilidade gástrica alterada e infecções anteriores estejam envolvidos.

Sobreposição de SII, SIBO e DF

Estudos mostram que o tratamento da DF pode melhorar quando se trata também o intestino delgado – o que levanta a suspeita de sobreposição com SIBO ou SIFO. A SIBO apresenta sintomas que se sobrepõem tanto aos da SII quanto aos da DF. Esse fato sugere uma possível relação causal ou consequencial entre esses distúrbios. O tratamento antimicrobiano da SIBO em pacientes com DF, que podem ou não ter SII, tem demonstrado melhora dos sintomas da DF.

Supercrescimento fúngico no intestino delgado (SIFO)

Menos falado, mas igualmente importante, o SIFO ocorre quando há crescimento excessivo de fungos (principalmente Candida) no intestino delgado. Os sintomas são similares aos do SIBO: inchaço, gases, dor abdominal e alterações intestinais.

A diferença é que, no SIFO, o tratamento com antibióticos não resolve – pelo contrário, pode piorar o quadro. Em geral, o SIFO aparece após o uso prolongado de antibióticos, imunossupressores ou em casos de disbiose severa. O diagnóstico ainda é difícil, mas cada vez mais profissionais consideram essa possibilidade quando o tratamento do SIBO não funciona.

Dois estudos recentes mostraram que 26% (24 de 94 pacientes) e 25,3% (38 de 150 pacientes) de uma série de pacientes com sintomas gastrointestinais inexplicáveis tinham SIFO. A dismotilidade do intestino delgado e o uso de inibidores da bomba de prótons (prazóis) foram apontados como possíveis fatores predisponentes à SIFO.

No entanto, são necessários mais estudos para confirmar essas observações e avaliar a relevância clínica do SIFO em indivíduos saudáveis e pacientes com sintomas gastrointestinais inexplicáveis. Ainda não está claro se a erradicação ou o tratamento da SIFO leva à resolução dos sintomas. Atualmente, uma terapia antifúngica de 2-3 semanas é recomendada e pode ser eficaz na melhora dos sintomas, mas faltam evidências para comprovar sua erradicação.

Outros fatores que influenciam nos sintomas

Além disso, é fundamental considerar fatores de confusão que impactam diretamente a saúde gastrointestinal, como comorbidades psicológicas, emoções intensas (como estresse, medo e ansiedade), uso de medicamentos, hábitos alimentares inadequados (como a má mastigação) e influências ambientais sobre o microbioma. Esses elementos podem não apenas agravar os sintomas, mas também imitar quadros clínicos como SIBO, SII, DF ou SIFO, tornando o diagnóstico ainda mais desafiador.

E se você tiver mais de uma condição ao mesmo tempo?

É comum que esses quadros se sobreponham. Alguém pode ter SII e, ao mesmo tempo, SIBO ou SIFO. Ou ainda, ser diagnosticado com DF e, na verdade, sofrer com um desequilíbrio microbiano intestinal. Por isso, é fundamental procurar um profissional capacitado que saiba avaliar os sintomas em conjunto e solicitar exames adequados. Com o diagnóstico certo, o caminho para o alívio dos sintomas fica muito mais claro.

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Mas, lembre-se: não é indicado manter a fase de exclusão da dieta de exclusão por mais que 6 semanas e, além disso, o acompanhamento profissional é importante porque parte dos pacientes possuem outras condições clínicas associadas que o protocolo não resolverá por completo e, portanto, necessita de condutas adicionais.

Referências

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