Nutricionista Adriana Lauffer

Má digestão? Saiba o que fazer

o que fazer para má digestão

Está com aquela sensação de estufamento, arrotos frequentes ou queimação? Esses são sinais clássicos de má digestão, um problema comum que pode aparecer após uma refeição mais pesada, apressada ou mal combinada. Pesquisas mostram que aproximadamente 40% da população mundial sofre com algum tipo de desconforto digestivo ocasional.

A boa notícia é que, na maioria das vezes, dá para aliviar o desconforto com estratégias baseadas em evidências — e prevenir que ele volte. Neste artigo, você descobrirá o que fazer imediatamente após sentir má digestão e como evitar que isso se torne um problema crônico.

Sintomas comuns da má digestão

Antes de tudo, é importante identificar os principais sinais de que sua digestão não está funcionando adequadamente:

  • Sensação de peso no estômago após comer;
  • Estufamento e gases após as refeições;
  • Azia e queimação retroesternal (atrás do osso do peito);
  • Náuseas leves pós-prandiais (após alimentação);
  • Arrotos frequentes e odor desagradável na boca;
  • Sabor amargo ou metálico na boca;
  • Sonolência excessiva pós-prandial.

Importante: sintomas ocasionais são comuns, mas caso persistam por mais de duas semanas ou venham acompanhados de dor intensa, perda de peso não intencional, dificuldade para engolir ou sangue nas fezes, consulte imediatamente um médico, pois podem indicar condições mais sérias.

8 estratégias cientificamente embasadas para melhorar sua digestão

1. Pratique a alimentação consciente

O estresse ativa o sistema nervoso simpático (“luta ou fuga”), reduzindo significativamente o fluxo sanguíneo para o sistema digestivo. Portanto, antes de começar a comer, sente-se confortavelmente, respire fundo algumas vezes para acalmar a mente e evite telas e distrações. Estudos demonstram que comer em estado de relaxamento aumenta a produção adequada de enzimas digestivas e melhora a motilidade intestinal.

2. Mastigue adequadamente os alimentos

A mastigação não apenas tritura mecanicamente os alimentos, mas também inicia a digestão química através da amilase salivar, que quebra carboidratos complexos, e da lipase lingual, que começa a digestão de gorduras. Além disso, a mastigação adequada desencadeia a liberação antecipada de enzimas pancreáticas e biliares, preparando todo o sistema digestivo para receber o alimento. Procure mastigar cada porção entre 20-30 vezes, dependendo da consistência do alimento.

3. Mantenha a postura adequada após as refeições

Deitar-se imediatamente após comer pode facilitar o refluxo ácido devido à pressão sobre o esfíncter esofágico inferior. O ideal é manter o tronco ereto por pelo menos 60-90 minutos após a refeição. Caso sinta necessidade de descansar, opte por uma posição semi-sentada, com elevação de 30-45 graus na parte superior do corpo, o que minimiza significativamente episódios de refluxo conforme demonstrado em estudos de pHmetria esofágica.

4. Faça caminhadas leves

Uma caminhada de 10-15 minutos após a refeição pode estimular a motilidade gastrointestinal, acelerando o esvaziamento gástrico e reduzindo a sensação de plenitude. A contração muscular durante a caminhada também auxilia no movimento peristáltico intestinal, diminuindo a formação de gases. Contudo, evite exercícios intensos por pelo menos 2 horas após comer, pois podem desviar o fluxo sanguíneo do sistema digestivo para os músculos, prejudicando a digestão.

5. Beba chás digestivos com respaldo científico

Diversos estudos clínicos comprovam a eficácia de certos compostos vegetais no alívio dos sintomas digestivos. Os mais eficazes incluem:

  • Chá de gengibre: contém gingeróis e shogaóis que aceleram o esvaziamento gástrico e reduzem náuseas.
  • Chá de hortelã-pimenta: o mentol presente relaxa a musculatura lisa do trato gastrointestinal, aliviando espasmos.
  • Chá de camomila: com apigenina e outros flavonoides que apresentam efeito anti-inflamatório e antiespasmódico.
  • Chá de erva-doce: o anetol presente possui propriedades carminativas, reduzindo a formação de gases.

ATENÇÃO: se você tem refluxo gastroesofágico, síndrome do intestino irritável (SII) ou intolerância à histamina, alguns desses chás podem não ser indicados. Consulte seu nutricionista.

6. Faça compressas mornas na região abdominal

O calor moderado (37-40°C) aplicado na região epigástrica promove vasodilatação local, aumentando o fluxo sanguíneo e relaxando a musculatura lisa do trato digestivo. Para isso, utilize uma bolsa térmica morna sobre o abdômen superior por 15-20 minutos. Estudos termográficos demonstram que esta prática pode reduzir significativamente o desconforto abdominal relacionado à distensão gástrica e espasmos intestinais.

7. Anote o que você comeu

O monitoramento sistemático das reações alimentares permite identificar padrões individuais de intolerância ou sensibilidade. Ao manter um diário alimentar, registre:

  • O que você comeu (com ingredientes específicos);
  • Quantidade aproximada;
  • Horário da refeição e duração;
  • Nível de estresse durante a refeição (nota de 1-10);
  • Sintomas e tempo até o aparecimento;
  • Intensidade dos sintomas (nota de 1-10).

Após 2-3 semanas, análises de padrões podem revelar correlações significativas entre determinados alimentos ou combinações e seus sintomas específicos.

8. Evite auto medicação e busque orientação profissional em casos recorrentes

A automedicação com antiácidos, inibidores de bomba de prótons ou procinéticos pode mascarar sintomas importantes e, em casos de uso prolongado, alterar significativamente a microbiota intestinal e a absorção de nutrientes essenciais. Se a má digestão ocorre regularmente (mais de 2-3 vezes por semana), é fundamental investigar causas subjacentes como:

  • Hipocloridria: a hipocloridria se dá pela produção insuficiente de ácido clorídrico, comum em idosos e pessoas com uso prolongado de medicamentos supressores de ácido;
  • Insuficiência pancreática exócrina: deficiência na produção de enzimas digestivas;
  • Disbiose intestinal: desequilíbrio na composição da microbiota intestinal, conhecida como disbiose;
  • Intolerâncias alimentares não identificadas: como a intolerância à lactose, intolerância à histamina ou FODMAPs devido à síndrome do intestino irritável;
  • Síndrome do supercrescimento bacteriano no intestino delgado (SIBO): colonização excessiva do intestino delgado por bactérias.

Considerações adicionais grupos específicos

Para idosos

O envelhecimento naturalmente reduz a produção de ácido gástrico e enzimas digestivas. Pessoas acima de 65 anos podem se beneficiar de suplementação enzimática e refeições menores distribuídas ao longo do dia.

Para gestantes

O aumento dos níveis de progesterona durante a gestação relaxa a musculatura lisa, incluindo o esfíncter esofágico inferior, predispondo ao refluxo. Elevação da cabeceira da cama e refeições menores são especialmente importantes.

Para pessoas com condições crônicas

Diabéticos podem apresentar gastroparesia (retardo no esvaziamento gástrico) devido à neuropatia autonômica. Já pacientes com hipotireoidismo frequentemente relatam motilidade intestinal reduzida. Em ambos os casos, o controle adequado da doença de base é fundamental para a melhora dos sintomas digestivos.

Conclusão

Conclusão: prevenção é o melhor remédio

A má digestão ocasional pode ser desconfortável, mas implementando as estratégias acima, é possível não apenas aliviar os sintomas imediatos como também prevenir episódios futuros. O respeito aos sinais corporais, a alimentação consciente e a identificação de padrões individuais são os pilares para um sistema digestivo saudável.

Se o desconforto persistir apesar das medidas adotadas, não ignore — isso pode sinalizar desequilíbrios que merecem avaliação profissional. Um nutricionista funcional e/ou gastroenterologista poderão identificar as causas específicas e elaborar um plano personalizado para restaurar seu bem-estar digestivo.

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Referências

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  2. Chey WD, et al. Regimen-Specific Behavioral and Lifestyle Recommendations for the Care of Patients with Functional Digestive Disorders. Gastroenterology. 2023;164(1):52-67.
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  4. Valussi M, et al. Functional dyspepsia: New insights into pathophysiology and therapy. World Journal of Gastroenterology. 2022;28(29):3858-3876.
  5. Lacy BE, et al. ACG Clinical Guideline: Management of Dyspepsia. American Journal of Gastroenterology. 2021;116(5):899-913.