Nutricionista Adriana Lauffer

Controvérsias da dieta FODMAP

controvérsias da dieta fodmap

A Síndrome do Intestino Irritável (SII) afeta aproximadamente 10% da população mundial, causando sintomas como dor abdominal, distensão, flatulência e alterações no hábito intestinal. Nos últimos anos, a dieta low FODMAP emergiu como uma abordagem terapêutica promissora para o manejo desses sintomas. No entanto, apesar de sua crescente popularidade, esta estratégia alimentar não está isenta de controvérsias e desafios significativos que merecem atenção.

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6 mitos e verdades sobre a dieta Fodmap

O que são os FODMAPs?

Os FODMAPs (Oligossacarídeos, Dissacarídeos, Monossacarídeos e Polióis Fermentáveis) representam um grupo de carboidratos de cadeia curta que são pouco absorvidos no intestino delgado. Consequentemente, estes compostos chegam ao intestino grosso, onde são rapidamente fermentados pelas bactérias intestinais, produzindo gases e aumentando a quantidade de água no lúmen intestinal. Para indivíduos com SII, que frequentemente apresentam hipersensibilidade visceral, este processo pode desencadear ou agravar os sintomas digestivos.

As críticas sobre a dieta Low FODMAP

Desde a primeira pesquisa mostrando as evidências da eficácia da dieta FODMAP para o manejo da síndrome do intestino irritável (SII), ela tem ganhado popularidade. No entanto, alguns pesquisadores começaram a levantar alguns questionamentos sobre ela.

A preocupação central sobre a segurança da dieta tem sido em relação à primeira fase dela, que é a fase de eliminação dos alimentos ricos em FODMAP, pois alguns pesquisadores acreditam que ela poderia comprometer a saúde física e mental do paciente.

As críticas negativas alegadas são:

  1. A restrição da diminui a quantidade de bactérias da microbiota
  2. Propõe restrição alimentar intensa;
  3. É pobre em fibras solúveis e prebioticos;
  4. Leva a carências nutricionais a longo prazo;
  5. Compromete do comportamento alimentar em pessoas suscetíveis devido à restrição alimentar.

Vamos discutir um pouco sobre essas alegações.

1. A restrição dos FODMAPs diminui a quantidade de bactérias da microbiota

Esta crítica tem fundamento científico, mas precisa ser contextualizada. A dieta low FODMAP, especialmente em sua fase restritiva, pode reduzir temporariamente a abundância de bactérias benéficas como Bifidobactérias. Porém, isso não deve ser interpretado como um efeito permanente ou irreversível.

O protocolo atual da dieta low FODMAP não é planejado como uma restrição permanente, mas sim como um programa estruturado em três fases. A fase de reintrodução e personalização permite que FODMAPs tolerados sejam reincorporados à dieta, o que ajuda a restaurar a microbiota. Além disso, a implementação de um plano personalizado a longo prazo minimiza esse impacto, mantendo apenas a restrição dos FODMAPs que realmente desencadeiam sintomas no indivíduo específico. Este processo de “personalização dietética” é fundamental para manter a saúde da microbiota enquanto ainda proporciona controle de sintomas

2. O protocolo Low FODMAP propõe restrição alimentar intensa

Esta crítica reflete uma compreensão incompleta da abordagem moderna da dieta low FODMAP. Embora inicialmente tenha sido implementada como uma lista rígida de alimentos “permitidos” e “proibidos”, a abordagem evoluiu para um programa mais flexível. A aplicação da dieta mudou de uma lista rígida de alimentos “permitidos” e “não permitidos” para um programa estruturado de restrição inicial de FODMAP seguido por reintrodução de alimentos e, finalmente, personalização”. Além disso, essa lista categórica mudou para uma lista de alimentos permitidos, moderados e evitar, sendo que os moderados e evitar contêm doses seguras de consumo.

Ainda, para pacientes que não necessitam de uma intervenção tão intensa, existe a opção da dieta “FODMAP-gentle”, que restringe apenas alimentos com concentração muito alta de FODMAPs, sendo menos restritiva. O objetivo final não é uma restrição permanente e severa, mas sim identificar e eliminar apenas os desencadeadores específicos dos sintomas.

3. A dieta Low FODMAP é pobre em fibras solúveis e prebióticos

Esta crítica pode ser parcialmente válida durante a fase de restrição inicial, mas não representa a abordagem completa da dieta, especialmente se o plano alimentar do paciente não for bem elaborado pelo profissional. A fase restritiva é temporária (geralmente 2-6 semanas) e deliberadamente reduz prebióticos para avaliar a resposta dos sintomas ao protocolo. No entanto, a reintrodução subsequente visa identificar quais FODMAPs são tolerados, permitindo a reincorporação de prebióticos que não causam sintomas.

Os especialistas reconhecem essa preocupação e, por isso, a avaliação cuidadosa do paciente e o gerenciamento, preferencialmente através de um nutricionista treinado em FODMAP, reduzirão o risco disso acontecer. Além disso, durante a fase restritiva, podem ser recomendados suplementos de fibra solúvel livre de FODMAPs ou alimentos low FODMAP ricos em prebióticos nas suas doses seguras de consumo para manter a ingestão adequada.

4. A dieta Low FODMAP leva a carências nutricionais a longo prazo

Esta crítica desconsidera a natureza temporária da fase restritiva e a importância do acompanhamento nutricional. Quando implementada corretamente, sob orientação profissional, a dieta low FODMAP não leva a deficiências nutricionais até porque não exclui por completo nenhum grupo de alimento. Como destacado já anteriormente, uma avaliação e gerenciamento cuidadosos do paciente, preferencialmente através de um nutricionista treinado em FODMAP, eliminarão qualquer risco de comprometimento da saúde nutricional.

Lembre-se que a fase de personalização garante que a dieta a longo prazo seja nutricionalmente adequada, mantendo apenas as restrições necessárias para o controle dos sintomas. Além disso, pode-se recomendar suplementação específica se necessário, embora estudos mostrem que, quando adequadamente implementada, a dieta low FODMAP é nutricionalmente completa.

5. Compromete o comportamento alimentar em pessoas suscetíveis devido à restrição alimentar

Esta é uma preocupação legítima que merece atenção, mas pode ser gerenciada adequadamente. As preocupações sobre a segurança da dieta têm se centrado em torno da eliminação inicial, que poderiam levar ao comprometimento da saúde nutricional e psicológica. Por isso, para mitigar esse risco, recomenda-se uma avaliação psicológica prévia em pacientes com histórico ou risco de transtornos alimentares.

Em casos de risco elevado, abordagens menos restritivas como a “FODMAP-gentle” (FODMAP-gentil) podem ser preferíveis. Além disso, a abordagem atual enfatiza o empoderamento do paciente, onde o objetivo é que “os pacientes sejam capacitados para ajustar sua dieta por conta própria para alcançar bom manejo dos sintomas”. Dessa forma, este foco na autonomia e na tomada de decisão informada pode, na verdade, promover uma relação mais saudável com a alimentação, em vez de comprometê-la.

Conclusão

Muitas das críticas à dieta low FODMAP resultam de uma compreensão incompleta de sua implementação moderna, que enfatiza as três fases (restrição, reintrodução e personalização) e não apenas a fase restritiva inicial e não considera a possibilidade de consumir as doses seguras dos alimentos moderados e proibidos. Com orientação profissional adequada e uma abordagem individualizada, as preocupações levantadas podem ser efetivamente gerenciadas, permitindo que os pacientes se beneficiem do alívio dos sintomas enquanto minimizam potenciais efeitos adversos.

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Mas, lembre-se: não é indicado manter a fase de exclusão da dieta de exclusão por mais que 6 semanas e, além disso, o acompanhamento profissional é importante porque parte dos pacientes possuem outras condições clínicas associadas que o protocolo não resolverá por completo e, portanto, necessita de condutas adicionais.

Referências

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