Nutricionista Adriana Lauffer

Como a microbiota exerce seu efeito no nosso organismo

Como a microbiota exerce seu efeito no nosso organismo

A microbiota intestinal exerce efeitos fundamentais sobre a nossa saúde por meio de diversos mecanismos. Ela atua de forma direta, interagindo com as células intestinais, e de maneira indireta, ao influenciar processos imunológicos, metabólicos e hormonais. Vamos entender como essas ações acontecem em cinco principais frentes: proteção, metabolismo, digestão, imunidade e regulação genética.

Ação protetora

A microbiota intestinal contribui para a proteção contra microrganismos patogênicos. Bactérias benéficas colonizam a mucosa intestinal e impedem a instalação de patógenos por diversos mecanismos. Elas competem por nutrientes e receptores celulares, produzem substâncias antimicrobianas, como bacteriocinas e colicinas, e fermentam fibras solúveis, gerando ácidos graxos de cadeia curta (AGCC), como butirato, acetato e propionato. Esses ácidos reduzem o pH intestinal, criando um ambiente hostil para bactérias nocivas.

Além disso, bactérias comensais dificultam a formação de biofilmes por cepas patogênicas. Como o biofilme é uma barreira que protege microrganismos contra antibióticos, a sua inibição aumenta a eficácia dos tratamentos antimicrobianos.

Ação metabólica

A microbiota também participa ativamente do metabolismo do corpo humano. Ela estimula a diferenciação das células epiteliais intestinais, modifica a absorção de vitaminas e minerais, e metaboliza compostos potencialmente carcinogênicos presentes na dieta.

Mais ainda, determinadas cepas produzem neurotransmissores e hormônios que afetam órgãos como a hipófise, tireoide, glândulas adrenais e gônadas. Essa atuação explica a conexão entre desequilíbrios da microbiota e distúrbios metabólicos, como obesidade e diabetes tipo 2.

Regulação genética

Algumas bactérias influenciam diretamente a expressão gênica ao interagirem com os chamados receptores nucleares (RNs). Esses receptores funcionam como sensores moleculares e regulam a atividade de genes relacionados à produção de energia, inflamação e resposta imunológica.

Entre os principais RNs influenciados pela microbiota estão os PPARs (Peroxisome Proliferator-Activated Receptors), os receptores de vitamina D (VDR) e os receptores de hormônios tireoidianos e esteroides. Além disso, bactérias intestinais modificam os sais biliares primários em secundários, que estimulam células intestinais L a liberar hormônios como GLP-1 e PYY, responsáveis pela regulação da saciedade e do metabolismo energético.

Ação digestiva

A microbiota desempenha papel essencial na digestão de compostos que o organismo humano não consegue degradar sozinho. Por exemplo, bactérias do gênero Lactobacillus produzem beta-galactosidase, facilitando a digestão da lactose e aliviando sintomas de intolerância.

Ao fermentar fibras alimentares, as bactérias geram AGCC que beneficiam o intestino e o sistema nervoso central, por meio do chamado eixo intestino-cérebro. Isso reforça a importância do consumo de fibras solúveis na dieta para manter a saúde geral.

Ação imunomoduladora

Talvez uma das funções mais críticas da microbiota seja a modulação do sistema imunológico. As bactérias comensais interagem com receptores imunológicos como os toll-like receptors (TLRs), presentes em células do intestino, como as células de Paneth e as células dendríticas. Essas interações ajudam a calibrar a resposta imunológica, prevenindo tanto infecções quanto reações exacerbadas — como nas doenças autoimunes ou alérgicas.

Além disso, a microbiota estimula a produção de muco, IgA e defensinas pelas células intestinais e contribui para a manutenção da barreira intestinal, reduzindo o risco de inflamações crônicas e de permeabilidade intestinal aumentada.

Conclusão

A microbiota intestinal atua como um órgão invisível, influenciando nossa imunidade, metabolismo, digestão, expressão genética e até comportamento. Entender suas funções é essencial para desenvolver abordagens terapêuticas eficazes, especialmente em tempos em que se reconhece o papel central do intestino na saúde sistêmica.

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Referências

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